BOLETIM EPIDEMIOLÓGICO

SERVIÇO DE EPIDEMIOLOGIA / HFSE / SAS / MS

ANO XXXI - Nº 58 – JAN A DEZ / 2020

EDITORIAL

COVID-19


A pandemia de Covid-19, assim declarada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 11/03/2020, fixou-se como a síndrome respiratória viral mais importante desde a pandemia de influenza H1N1 em 1918. Desde então, diversos países passaram por diferentes curvas de crescimento de casos e óbitos, com alguns se encaminhando para uma segunda onda de infecção atualmente. O aumento exponencial de casos com necessidade de internação hospitalar trouxe a preocupação com o colapso dos sistemas de saúde, levando diversos países a adotarem medidas de distanciamento social, a fim de reduzir a incidência. Enquanto isso, a procura por intervenções farmacológicas eficazes prossegue, em diversos estudos ao redor do mundo, e a vacinação começa a ser realizada em diferentes países, na perspectiva de um impacto positivo.

No Brasil, até o 04/01/2021 foram registrados 7.553.752 casos confirmados e 196.561 óbitos (disponível em https://covid.saude.gov.br), sendo o terceiro país com maior número de casos acumulados, atrás dos EUA e Índia, e o segundo em óbitos acumulados, atrás dos EUA (disponível em https://covid19.who.int/table). A taxa de mortalidade no Brasil está em 93,5 por 100 mil habitantes, sendo que no estado do Rio de Janeiro está em 148 por 100 mil habitantes

Em meio ao monitoramento e previsões da evolução da disseminação do vírus, o combate continua e os profissionais de saúde, que cotidianamente estão no enfrentamento da doença, configuram um grupo de risco singularmente vulnerável à COVID-19, apesar dos protocolos de controle de infecções e da utilização de equipamentos de proteção individual (EPIs). 

No Brasil, até 17/10/2020 (SE 42) foram notificados 1.560.994 casos de síndrome gripal suspeitos de COVID-19 em profissionais de saúde no e-SUS Notifica, dos quais 369.260 (23,6%) já confirmados. Entre os confirmados predominaram: técnicos/auxiliares de enfermagem - 34,1%, enfermeiros - 14,9%, médicos - 10,7%, agentes comunitários de saúde - 5,0% e recepcionistas de unidades de saúde - 4,2%). No mesmo período, no SIVEP-Gripe, foram notificados 2.144 casos de SRAG hospitalizados em profissionais de saúde (dos quais 67,3% já confirmados), sendo técnicos/auxiliares de enfermagem - 33,6%, médicos -21,4% e enfermeiros - 17,5%; 18,1% do total evoluíram para óbito (disponível em https://www.gov.br/saude/pt-br/media/pdf/2020/outubro/23/boletim_epidemiologico_covid_36_final.pdf).

Faz-se necessária a educação permanente para reforço das medidas profiláticas: uso correto da máscara adequada à situação e higienização frequente das mãos com produto alcoólico a 70% ou com água e sabão líquido; em procedimentos geradores de aerossóis, além da higienização frequente das mãos, deve-se utilizar roupa privativa - capote; gorro; máscara N95/PFF2; luvas de procedimento; protetor facial ou óculos de proteção. Os protocolos de biossegurança estão detalhados na intranet do HFSE, considerando as diferentes situações envolvidas.

Além das precauções para prevenção do bem estar físico dos profissionais de saúde, há ainda as implicações psicológicas da pandemia, que atingem a população de forma geral e de forma singular os trabalhadores atuantes em seu enfrentamento. Alguns países relataram agravos como ansiedade, depressão, estresse e até mesmo casos de suicídio como potenciais complicações psicológicas da COVID-19.

A garantia de protocolos efetivos de segurança nas unidades de saúde, o uso de EPIs, o treinamento e a oferta de condições adequadas de trabalho, além do apoio aos profissionais de saúde, são medidas necessárias para respostas efetivas no enfrentamento à pandemia. O adoecimento e o óbito entre esses trabalhadores são sinais de alerta acerca da progressão da disseminação do vírus.

Este Boletim apresenta uma síntese preliminar sobre o perfil dos casos suspeitos de COVID-19 atendidos e notificados no HFSE, internados e ambulatoriais, mostrando a magnitude da pandemia na nossa unidade.

 

 

 

Perfil dos casos suspeitos de COVID-19 notificados no HFSE até a Semana Epidemiológica 53/2020

1Escosteguy, C.C.1; 1Pereira, A.G.L.; 1Marques, M.R.V.E.; 1Eleuterio, T.A; 2Ribeiro, J.W.M.; 2 Lobo, L.M.; 3Almeida, B.C.F.; 3Oliveira Oliveira, P.W.

1Serviço de Epidemiologia/HFSE; 2Residência Multiprofissional em Saúde Coletiva/IESC/UFRJ; 3Graduação em Saúde Coletiva/IESC/UFRJ.

Este estudo apresenta o consolidado dos casos suspeitos de COVID-19 atendidos e notificados no Hospital Federal dos Servidores do Estado (HFSE) desde o primeiro caso notificado e internado na instituição em 05/03/2020 até 02/01/2021, no fechamento da semana epidemiológica 53 (SE 53). As notificações foram de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) e de Síndrome Gripal (SG) segundo os critérios do Ministério da Saúde1. De acordo com o fluxo da vigilância epidemiológica, as SG foram inicialmente inseridas no sistema RedCap e posteriormente no e-SUS Notifica; as de SRAG foram encaminhadas digitalizadas à Divisão de Vigilância em Saúde/CAP 1.0 e ao Centro de Informações Estratégicas e Resposta de Vigilância em Saúde (CIEVS), uma vez que no município do Rio de Janeiro a digitação no SIVEP-Gripe não está descentralizada para todo o nível hospitalar. O critério de confirmação de COVID-19 nos casos de SRAG foi laboratorial por RT-PCR ou clínico-epidemiológico/clínico-imagem; para as SG o inquérito sorológico realizado pelo Laboratório viabilizou ainda a confirmação laboratorial por sorologia IgM e IgG para os funcionários.

A tabela 1 mostra que até a SE 53 foram notificados 3660 casos, sendo 2832 SG ambulatoriais (77,4%) e 828 casos (22,6%) internados. Entre os internados, 772 preencheram critérios de SRAG e 56 representaram SG com comorbidades. A confirmação de COVID-19 entre os casos ambulatoriais está em 44,2% até o momento e entre os casos de SRAG internados 48,8%. Os casos em investigação ainda não tiveram o diagnóstico de COVID-19 confirmado ou descartado até o fechamento da SE 53. Entre os casos notificados há 6 suspeitos de reinfecção por COVID-19, sendo 5 SG em profissionais de saúde do HFSE e 1 SRAG em profissional de outra unidade.

Tabela 1. Confirmação do diagnóstico de COVID-19 nos casos de SG e SRAG notificados no HFSE de março a 02/01/2021 (até a SE 53).

Diagnóstico de COVID-19

SG (ambulatoriais)

SRAG (internados)*

Total

Confirmado laboratorial **

1253

404

1657

Descartado laboratorial

826

396

1222

Em investigação

753

28

781

Total

2832

828

3660

*Inclui 56 SG com comorbidades que foram internadas. **Inclui 42 confirmados clínico-epidemiológicos (6 SG e 36 SRAG). Fonte: Epidemiologia/HFSE. Dados sujeitos a revisão.

 

A tabela 2 apresenta o desfecho dos casos internados segundo confirmação do diagnóstico de COVID-19. A letalidade hospitalar dos casos confirmados de COVID-19 está em 32,9%; a letalidade nos casos de SRAG COVID-19 descartados está em 30,6%, diferença não significativa (OR=1,12, IC95% 0,83;1,50).

 

Tabela 2. Confirmação do diagnóstico de COVID-19 e desfecho dos casos de SRAG* notificados e internados no HFSE de março a 02/01/2021.

Diagnóstico de COVID-19

Alta/Cura

Transferido para referência

Ainda internado em 02/01/2021

Óbito

Total

Confirmado laboratorial **

236

3

32

133

404

Descartado laboratorial

258

3

14

121

396

Em investigação

11

0

6

11

28

Total

505

6

52

265

828

*Inclui 56 SG com comorbidades que foram internadas. **Inclui 36 confirmados clínico-epidemiológicos. Fonte: Epidemiologia/HFSE. Dados sujeitos a revisão.

 


Gráfico 1. Notificações de SRAG/SG internadas por semana epidemiológica e confirmação de COVID-19, HFSE, março/2020 a 02/01/2021 (até a SE 53).

Fonte: Epidemiologia/HFSE. Dados sujeitos a revisão, atualização 02//01/2021.

Gráfico 2. Notificações de SG por semana epidemiológica e confirmação de COVID-19, HFSE, março/2020 a 02/01/2021(até a SE 53).

Fonte: Epidemiologia/HFSE. Dados sujeitos a revisão, atualização em 02/01/2021.

O gráfico 1 apresenta a distribuição dos casos suspeitos de COVID-19 internados no HFSE segundo semana epidemiológica da notificação e segundo confirmação do diagnóstico. O gráfico 2 apresenta a distribuição das SG ambulatórias segundo a semana epidemiológica da notificação e a confirmação do diagnóstico de COVID-19. Nas semanas epidemiológicas iniciais a proporção de casos ainda em investigação é grande, relacionada a pouca disponibilidade de testes diagnósticos naquele momento.

Análise preliminar das 2832 notificações de SG mostrou que 1937 (68,4%) eram profissionais de saúde/funcionários do HFSE, 700 (24,7%) pacientes, 72 (2,5%) acompanhantes/visitantes/outros e 123 (4,3%) não foram informados. Entre os profissionais de saúde notificados no HFSE, excluídos 18,2% em que a categoria não foi informada, predominaram médicos (15,7%, excluídos residentes; 53,0% confirmados), enfermeiros (14,8%; 54,5% confirmados), auxiliares de enfermagem (12,8%; 61,9% confirmados), técnicos de enfermagem (10,6%; 42,9% confirmados), administrativos (8,8%; 52,5% confirmados), auxiliares de serviços gerais (4,7%; 86,7% confirmados), residentes médicos (4,1%; 29,2% confirmados) e recepcionistas (4,0%; 57,1% confirmados). Estudo detalhado do perfil dos profissionais notificados está em andamento, lembrando que funcionários atendidos em outras unidades que não foram informados à Epidemiologia não estão incluídos neste consolidado.

Estudo nosso publicado recentemente que analisou os casos internados até a SE 27 encontrou, em análise multivariada, associação entre maior chance de óbito nos casos COVID-19 confirmados com faixa etária crescente (50 a 69 anos: OR=11,65, IC95%:1,69;80,33; 70 ou mais anos: OR=8,43; IC95% 1,22;58,14); presença de neoplasia (OR=4,34; IC95%:1,28;14,76); e uso de suporte ventilatório invasivo (OR=70,20 – IC95% 19,09;258,19).2

  A pandemia impôs grandes desafios ao hospital, que mesmo não sendo uma unidade de referência para enfrentamento da COVID-19 no estado, sofreu o impacto do grande volume de casos, incluindo o adoecimento de seus funcionários. Entre os desafios enfrentados ressaltamos: a baixa oferta inicial de testes para diagnóstico; a necessidade de organização de fluxos internos para a assistência dos casos suspeitos, incluindo a organização da triagem externa e da estrutura de coleta de swab para realização de PCR para SARS-CoV-2; necessidade de capacitação continuada das equipes, inclusive para o uso racional e correto de equipamentos de proteção individual (EPI). A letalidade elevada observada nos casos internados reforça a necessidade de diagnóstico e tratamento precoces, e a importância da adesão aos protocolos de biossegurança.

Referências:

1.                   Ministério da Saúde. Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde. Coronavírus COVID-19: diretrizes para diagnóstico e tratamento da COVID-19 [Internet]. Versão 4. Brasília: Ministério da Saúde; 2020 [citado 2020 nov 3]. Disponível em: https://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2020/May/08/Diretriz-Covid19-v4-07-05.20h05m.pdf.

2.                   Escosteguy CC, Eleuterio TA, Pereira AGL, Marques MRVE, Brandão AD, Batista JPM. COVID-19: estudo seccional de casos suspeitos internados em um hospital federal do Rio de Janeiro e fatores associados ao óbito hospitalar. Epidemiol. Serv. Saúde [online]. 2021, vol.30, n.1, e2020750.  Epub Dec 18, 2020. https://doi.org/10.1590/s1679-49742021000100023.

 

 


VIGILÂNCIA EPIDEMIOLÓGICA

Distribuição dos casos suspeitos de agravos de notificação compulsória notificados ao Serviço de Epidemiologia/HFSE - janeiro a dezembro de 20201

Agravo

Janeiro a junho

Julho a dezembro

Total

Síndrome gripal

1059

1773

28322

Síndrome respiratória aguda grave

373

462

8353

Criança exposta ao HIV

114

102

216

Meningites

111

92

203

Hepatites virais

67

98

165

Aids/HIV positivo

80

58

138

Gestante exposta ao HIV

85

42

127

Sífilis adquirida exceto em gestante

31

72

103

Sífilis congênita

45

36

81

Tuberculose

50

31

81

Sífilis em gestante

31

12

43

Acidente de trabalho com exposição a fluido

27

1

28

Outros acidentes de trabalho

15

5

20

Dengue e febre de chikungunya

16

2

18

Toxoplasmose congênita

4

13

17

Violência doméstica, sexual e/ou outras violências

9

4

13

Sarampo

12

0

12

Evento adverso pós-vacinal

8

0

8

Leptospirose

8

0

8

Caso suspeito de reinfecção por COVID-19

0

6

6

Anemia falciforme

2

2

4

Doença de Chagas

2

1

3

Doença neuroinvasiva por arbovírus                                                                                                                                                                                                                                                                    

3

0

3

Esquistosomose

3

0

3

Exantema em gestantes

3

0

3

Óbito materno

2

1

3

Intoxicação exógena

1

1

2

Leshmaniose visceral

1

1

2

Malária

2

0

2

Microcefalia

2

0

2

Tétano acidental

1

1

2

Doença de Creutzfeldt-Jakob

0

1

1

Esporotricose

1

0

1

Hanseníase

0

1

1

Parotidite epidêmica

1

0

1

Paralisia flácida aguda

0

1

1

Toxoplasmose gestacional

1

0

1

Total

2170

2819

4989

1Excluídos 4 surtos (sarampo: 1; COVID-19: 3, sendo 2 hospitalares e 1 relacionado a evento externo). 2Inclui 2 casos notificados em 02/01/2021 (final da SE 53). 3Inclui 2 casos notificados em 01/01/2021 (SE 53) e 7 casos de SRAG notificados até fevereiro 2020, anteriores à pandemia de COVID-19. Fonte: SINAN e NC - Serviço de Epidemiologia/HFSE. Dados sujeitos a revisão.

Expediente:

Direção Geral do Hospital Federal dos Servidores do Estado - Benito Accetta

Coordenação Assistencial - Antônio José de Souza Cypriano Neves

Responsável Técnico pela Área de Epidemiologia - Claudia Caminha Escosteguy

Elaboração - Área de Epidemiologia/HFSE; Residentes de Saúde Coletiva Joyce Willeman Monroe Ribeiro e Lucas Martins Lobo; Acadêmicos de Saúde Coletiva Brenda Cristine Fernandes de Almeida e Pedro Willian Marques de Oliveira.

Hospital Federal dos Servidores do Estado – http://hse.rj.saude.gov.br

Tel: (21) 2291-3131 Ramal 3235. E-mail: epidemiologia.hfse@gmail.com