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Ivan Rocha Ferreira da Silva - Estudante do quinto ano da graduação da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro/UERJ.
Vem de longa data a presença de estudantes de medicina não sõ em hospitais universitários, mas também em grandes serviços de saúde, em sua maioria públicos. Desde a antigüidade a atividade médica tem sua atuação comentada: na Assíria e na Babilônia a medicina era monopólio da casta sacerdotal, responsável apenas frente aos deuses; os cirurgiões, contudo, eram leigos e respondiam pelas intervenções praticadas, perante o Estado. A importância do médico operador, na antiga Mesopotâmia, é demonstrada pelo Código de Hamurábi (1900 a.C.) exemplificada no artigo 215 que dizia "(...) se porém, o médico, durante a intervenção, provocasse a morte ou perda da vista de um homem livre, teria ambas as mãos amputadas. Em se tratando de um escravo, o cirurgião seria obrigado a fornecer ao dono outro escravo (...)". Posteriormente, consagraram-se as doutrinas éticas Hipocráticas, na Grécia antiga, sendo a prática médica até hoje amplamente discutida nas mais variadas instâncias. O mesmo, no entanto, não pode ser dito quanto à atuação do graduando em medicina, muitas vezes resumida a resoluções internas em cada hospital
O estudante passou de mera sombra de seu preceptor a seu aprendiz e, muitas vezes, seu auxiliar, passando a exercer atos específicos autônomos ou sob supervisão. Apesar de não terem vinculação profissional com as instituições, os estudantes têm compromissos pelos quais poderão responder moral, jurídica ou administrativamente. Não existe atualmente um código de ética do estudante de medicina que regulamente esta atuação, tornando portanto pertinente à discussão do tema.
A discussão quanto a esta necessidade não é nova; em 1832, por meio de um decreto da regência trina do Brasil-Império, ficou determinado que as faculdades de medicina (resumidas às da Bahia e do Rio de Janeiro) deveriam formar " regimentos policiais para controle e supervisão da prática médica e de seus aprendizes". Em 1976, a Universidade de Goiás , através de uma comissão presidida pelo professor Celmo Celeno Porto, criou o primeiro código de ética do estudante de medicina do país, utilizado desde então em seu hospital-escola. Em março de 1991, o professor Genival V. França, o qual havia colaborado no trabalho de Goiás, coordenou a criação de um código similar na Universidade Federal da Paraíba, o qual depois veio a ser recomendado pelo Conselho Regional de Medicina do Estado da Paraíba; logo em seguida, foi criado em 1992 o código da Universidade Estadual de Londrina. Atualmente o Conselho Federal de Medicina estuda a confecção de um Código de Ética do Estudante de Medicina, que seria uniforme e válido para todo o Brasil.
Apesar de tal iniciativa ainda não estar em vigor, a atuação do estudante é amplamente comentada em resoluções do Conselho Federal de Medicina: a resolução CFM n.º 663/75 recomenda aos médicos a supervisão dos estudantes de medicina no trato com pacientes e em sua própria formação quando dispõe:
Na resolução n.º 664/75 do CFM, considera dentre outras coisas que " a ética médica deve ser ensinada aos estudantes de medicina ao longo de todo o seu curso médico (...)". Existem porém contradições dentro do próprio Código de Ética Médica dependendo de sua interpretação: no artigo 107, o código recrimina o médico que "deixar de orientar seus auxiliares e de zelar para que respeitem o segredo profissional a que estão obrigados por lei" e também o faz através do artigo 108 quanto à "facilitar o manuseio e conhecimento dos prontuários, papeletas e demais folhas de observações médicas sujeitas ao segredo profissional, por pessoas não obrigadas ao mesmo compromisso". Como o estudante de medicina normalmente tem acesso a esses documentos médicos, mas não é obrigado a segredo profissional, por essa interpretação o médico estaria infringindo o Código ao deixar o estudante ter acesso à tais documentos.
O estudante pode ser enquadrado em Prática Ilegal da Medicina, segundo o Código Penal, se este realizar algum ato médico, lesivo ou não, sem supervisão. Porém, pelo mesmo código, não será enquadrado como crime se isto ocorrer em "algumas situações, consideradas inadiáveis e imprescindíveis, que o estado de necessidade aplaudiu e consagrou como lícitas".
Vários países da América Latina já possuem legislação específica, principalmente no tocante à responsabilidade e ao segredo médico, como, por exemplo, o artigo 15 da Ley de Ejercicio de la Medicina da Venezuela, que estatui: "Os estudantes de Medicina estão igualmente obrigados a guardar segredo sobre o que vêem, ouvem ou descobrem em sua função". No Código de Defesa do Consumidor, no artigo 6o, que menciona os direitos básicos do consumidor, está dito que o consumidor tem direito "à proteção da vida, saúde e segurança contra riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços (...)", aí sendo incluído qualquer atividade no serviço público, do qual fazem parte por lei os estudantes que recebam bolsa e estagiem em hospitais públicos.
A discussão quanto ao tema é vasta e infindável, porém urge que se crie um
modelo oficial
e definitivo de um código de ética do estudante de medicina, para que o
paciente se torne
mais protegido e o estudante mais responsável e seguro.
"Sábio
é aquele que conhece bem os limites da própria ignorância"
Sócrates
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